quinta-feira, 29 de julho de 2010

INTERNET - AO RÉS DO CHÃO

Tudo começou como uma brincadeira: um site que defende a candidatura Dilma Rousseff criou uma página heterodoxa do jornal baiano A Tarde e inventou a manchete "Serra: vou criar o Ministério do Acarajé".

Imediatamente, virou verdade: blogs e sites petistas a usaram para criticar o candidato tucano. A falsa notícia enganou os editores do Blog da Dilma e do Amigos do Presidente Lula. Saiu no sábado, saiu no domingo, e só na segunda à tarde se divulgou que era uma invenção.

Aí a tática mudou: os petistas (que tinham caído no truque) tentaram ridicularizar os tucanos, que também caíram, dizendo que desde o início eles sabiam de tudo.

Não, não sabiam. Mas o problema principal não é este: é que, com a Internet, que expandiu o universo de quem pode se manifestar, houve mudanças importantes na área da comunicação. É preciso aprender a lidar com isso - tanto em termos jornalísticos quanto no da responsabilidade legal pelo que é divulgado. Gostemos ou não, o mundo agora é outro.
Liberdade de expressão é fundamental; também é fundamental que a liberdade de expressão seja exercitada com responsabilidade. Já bastam os comentários falsos atribuídos a personagens de alta credibilidade como Marília Gabriela, Paulinho da Viola e Millôr Fernandes.

Os valentes anônimos que se multiplicam nos comentários da Internet são perfeitamente dispensáveis. Quem quiser insultar, agredir, ofender, que o faça, mas assumindo a responsabilidade.

Há literatos anônimos que defendem Hitler, o Ato Institucional nº 5, a tortura; que atacam etnias e religiões; que defendem a morte de seus adversários ideológicos. Isso só acontece porque estão protegidos por aquilo que chamam de "nicks" - os "nicknames", apelidos atrás dos quais se escondem.

Nos Estados Unidos, a prevenção a esse tipo de abuso já começou: há uma série de sites que, mantendo o espaço aberto a todo tipo de manifestação, exige de seus comentaristas que se identifiquem.

O Sun Chronicle, de Massachusetts, checa a identidade pelo número do cartão de crédito. O Buffalo News faz checagens diretas, exigindo que os comentaristas forneçam dados que permitam confirmar sua identidade. "Os comentários anônimos são com frequência racistas e sexistas", diz Margareth Sullivan, do Buffalo News, e podem "derrubar o teor e a reputação do site".

No Brasil, tudo depende do editor. Gustavo Chacra, que tem um primoroso blog sobre política internacional, leitura obrigatória para quem quer estar bem informado, proíbe formalmente o racismo e a falta de urbanidade. "Comentários islamofóbicos, anti-semitas e anti-árabes ou que coloquem um povo ou uma religião como superiores não serão publicados. Tampouco ataques entre leitores ou contra o blogueiro. Pessoas que insistirem em ataques pessoais não terão mais seus comentários publicados. Não é permitido postar vídeo. Todos os posts devem ter relação com algum dos temas acima. O blog está aberto a discussões educadas e com pontos de vista diferentes".

A frase "todos os posts devem ter relação com algum dos temas acima" pode parecer redundante, mas não é: vá a qualquer blog sobre futebol e achará discussões acirradas, em textos enormes, entre petistas e tucanos.

Ricardo Kotscho não é tão explícito quanto Chacra, já que não publica sistematicamente a lista do que não permite, mas age da mesma maneira correta: gente mal-educada, "os cachorros loucos", ficam de fora. E está certo: se o que se quer, com a liberdade propiciada pela Internet, é expor todos os pontos de vista sobre uma determinada questão, o insulto, os preconceitos e a grosseria impedem que se faça luz.

Escrito por Carlos Brickmann, Observatório de Imprensa

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