A palhaçada chama a atenção pela estética escatológica.
Tiririca, de peruca e vestido de branco, parodiando o cantor Roberto Carlos na
propaganda do grupo que lidera o processamento de carnes no mundo, espeta
bifões, entremeando risadas incontroláveis (e sem nenhum nexo) com estrambótica
versão da música “O Portão”, interpretada pelo Rei: “Eu votei, de novo vou
votar, Brasília é o seu lugar”. Em 2010, o deputado açambarcou 1,3 milhão de
votos embalado por um jingle em que prometia: “Vote no Tiririca, pior do que tá
não fica”. O profeta acertou na mosca. O quadro político pouco mudou, reformas
tão clamadas e prometidas ficaram ao léu, e Brasília continuará a ser lugar
aprazível para o ex-palhaço, que continua a brincar de circo.
Imutável também é a feição da campanha eleitoral. O desfile
de caras e bocas que se viu na TV neste início de programação eleitoral
comprova que a mudança política é uma quimera, a confirmar a ironia do axioma
francês “plus ça change, plus c’est la même chose” (“quanto mais as coisas
mudam, mais elas permanecem a mesma coisa”).
Da promessa à ação, muita embromação. Essa é a imagem da
prática política no país. Quem se lembra da primeira palavra pronunciada pelo
presidente Lula em 1º de janeiro de 2003, quando tomou posse? “Mudança: essa é
a palavra-chave, essa foi a grande mensagem da sociedade brasileira nas
eleições de outubro. A esperança, finalmente, venceu o medo, e a sociedade
brasileira decidiu que estava na hora de trilhar novos caminhos”.
Que slogans cobrem as promessas dos três principais
candidatos na campanha deste ano? Dilma Rousseff prega “mais mudança, mais
futuro”. Aécio Neves resgatou o “muda, Brasil” usado pelo avô Tancredo há 30
anos, saudando ainda os eleitores com um “bem-vindo à mudança”. Já o PSB
trabalhará com o slogan de Eduardo Campos, muito repetido nesses últimos dias:
“Coragem para mudar o Brasil”.
Qual a razão para pôr a mudança no altar mais alto das
promessas? Por ser esse o sentimento nacional. As pesquisas detectam que 67%
das pessoas reivindicam que o próximo presidente adote ações diferentes das da
atual administração.
O clima das ruas, fervente desde as manifestações de junho
de 2013, aponta para uma reviravolta nos padrões da gestão, implicando melhoria
dos serviços públicos, com destaque para mobilidade urbana, saúde, educação e
segurança. Nas entrelinhas enxergam-se um veto à mesmice, a condenação das
práticas eleitorais (as mesmas que se apresentam na campanha em curso), a
inapetência da representação política em promover a planilha de reformas, um
basta aos escândalos que flagram atores políticos nos mais diversos palcos da
corrupção.
Por que tais avanços não se concretizam? A resposta tem a
ver com falta de vontade de mudar, receio dos participantes de que mudar as
regras do jogo possa significar prejuízo para seus patrimônios eleitorais, além
da desarmonia entre os Poderes. Quando um não quer, a coisa não vai.
Por: Gaudêncio Torquato, Diário do Poder
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