O DEMsalão
Brasília tem duas faces. De um lado, a “bolha”, onde moram o presidente da República, os ministros, os parlamentares, os embaixadores estrangeiros, os ministros de tribunais superiores, os jornalistas e a elite do funcionalismo público e da cidade.
É um mundo de excelente qualidade de vida.
Casas ou mansões à beira do Paranoá, amplos apartamentos nas quadras mais nobres do Plano Piloto.
A outra face é governada pelo GDF. Um povo trabalhador, que paga seus impostos, mora longe do Plano Piloto, muitas vezes nas cidades-satélites.
A condução é escassa, a violência é grande, as invasões de terrenos são frequentes, muitas vezes estimuladas por políticos inescrupulosos.
A “bolha” atrai as atenções de jornalistas e analistas políticos e econômicos. Mas quase ninguém presta atenção ao GDF.
(Washington também é assim. Existe a “bolha”, com tudo o que há de bom, e a prefeitura do D.C., eternamente envolvida com políticos populistas e corruptos. Volta e meia um prefeito é apanhado fazendo o que não deve, seja com prostitutas, seja cheirando crack, seja com a boca na botija da corrupção mais deslavada.)
Desde que conseguiu a emancipação política e passou a eleger seus governadores, Brasília não teve muita sorte. Com a honrosa exceção de Cristóvam Buarque, o GDF ficou entregue a Joaquim Roriz, que foi governador por quatro mandatos.
Nomeado por José Sarney em 1987, Roriz foi eleito em 1990, em 1998 e em 2002, graças a políticas clientelistas, que incluíam estímulo a invasões de áreas à beira do lago Paranoá.
Eleito em 2006 para o Senado, Roriz envolveu-se num rumoroso caso de corrupção – uma estranhíssima compra de bezerras – e renunciou para não ser cassado.
Seu suplente, Gim Argello, também envolvido no mesmo caso, não foi nem advertido. Hoje é vice-líder do governo e o mais próximo conselheiro político da ministra Dilma Rousseff.
Ah, é também candidato a governador em 2010.
José Roberto Arruda foi um dos senadores mais poderosos durante o governo Fernando Henrique. Líder do governo na casa, mandava e desmandava no Senado, de súcia com o então presidente da casa, senador Antonio Carlos Magalhães.
Em 2001, associou-se a ACM para fraudar o painel do Senado, no caso da votação secreta que cassou o mandato do senador Luís Estêvão.
Apanhado, negou. Da tribuna, fez patético discurso.
Ninguém acreditou. Em lance de puro cálculo político, voltou à tribuna, chorou, reconheceu sua participação na fraude. Pediu desculpas.
E tratou de renunciar rapidinho, para não ser cassado.
Saiu do PSDB, ingressou no PFL e desapareceu. E aí começou tudo de novo.
Em 2002 foi eleito deputado federal. Em 2006 rompeu com Joaquim Roriz, de quem era cria, e elegeu-se governador do Distrito Federal, no DEM (o PFL depois da plástica).
De Roriz herdou não apenas o governo, mas as práticas.
O mensalão do DEM (ou DEMsalão, como já está sendo chamado) teria começado ainda no governo Roriz, de quem o denunciante, Durval Barbosa foi secretário.
As denúncias atingem tudo e todos. Do governador e o vice, a deputados distritais, secretários e, parece, gente do Judiciário.
Claro que o governador deu declarações negando tudo. Mas o estrago já foi feito.
Na reunião com a cúpula do DEM, Arruda ameaçou contar para todo mundo que o DEMsalão do Planalto Central foi utilizado também para ajudar outros diretórios do partido.
Com isso, o DEM rachou. De um lado, pressionaram pelo desligamento de Arruda os senadores José Agripino (RN) e Demóstenes Torres (GO), além do deputado Ronaldo Caiado (GO), líder do partido na Câmara.
Mas o senador Adelmir Santana (DF), suplente do vice-governador Paulo Octávio (também envolvido no escândalo), o deputado ACM Neto (BA) e, pasmem, até o próprio presidente nacional do DEM, deputado Rodrigo Maia, querem proteger o governador Arruda.
E os tucanos, como estão se comportando no episódio?
Afinal, o projeto estratégico da aliança PSDB-DEM era transformar Brasília num imenso canteiro de obras, fazer da capital uma cidade-modelo, aumentar ainda mais a enorme popularidade do governador Arruda e consolidar a aliança.
Serra para presidente e Arruda para vice.
E agora?
Até agora, os tucanos estão em silêncio.
E o governador José Serra, não tem nada a dizer?
E assim, um escândalo local se transforma em escândalo nacional.
A coisa promete.
Lúcia Hippolito é Cientista Política
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