Xico Sá - Folha de São Paulo
Como hoje estou totalmente desprovido daquela velha opinião formada sobre tudo -mantra do Raul que é a cara de muitos blogueiros de plantão-, volto a um assunto no qual tenho mais milhagem. E nem por isso mais sabedoria.
Como os leitores mais antigos sabem, tentamos aqui, rebordosa
após rebordosa, sempre incrementar os nossos mandamentos da boemia, uma obra
aberta que conta, a cada post escrito e reescrito, com a colaboração de vocês,
amadores, profissionais ou simplesmente estagiários.
Sim, com o sol das grandes ressacas por testemunha, como
diria o velho e profissionalíssimo Hemingway, é normal pensar em casamento, ser
um bom homem etc. No livro “Pileques” (acima), outro mestre já refletia sobre
essa metafísica do chá de boldo.
É o que temos para esta terça de ressaca cívica no país
rojão diário:
I) Amigo(a), boemia é como futebol, é ritmo de jogo,
sequência; se tu largas por uns dias, ela te pega na volta, mesmo que peças,
suplicante, a tua nova inscrição.
II) É de bom-tom sempre guardar definitivamente o nome dos
garçons, afinal de contas é no ombro deles que vais chorar, ao som de “Nervos
de Aço”, a inevitável, acachapante e humaníssima dor de corno.
III) Na saúde e na doença, a culpa será sempre do
tira-gosto, ah, aquela calabresa, aquele torresmo, aquela azeitona me fez mal à
beça… Jamais a culpa será da sagrada bebedeira em si.
IV) A divisão do tempo da prosa, na mesa de um bar, deve
obedecer ao seguinte critério: 50% sobre mulheres, 40% sobre futebol e 10%
sobre as ressacas monstruosas, a nostalgia precoce das quedas. E que venham as
próximas.
V) Direito máximo do consumidor boêmio: desde que o freguês
não se incomode com água e sabão nos pés, poderá ficar no recinto até a descida
do portão de ferro.
VI) É livre o “pindura”, data vênia, para fregueses com mais
de cinco anos de casa, como reza a lei do usucapião.
VII) Meu bar/meu mar… É permitido nadar no seco.
VIII) Andem sempre com o endereço e os seus nomes completos
pendurados na correntinha do pescoço.
IX) No país da impunidade, a saideira é como a lei, existe
para ser desobedecida. Seu garçom faça o favor!
X) Procures sentar, amigo, sempre nas primeiras mesas do
botequim, se possível na calçada, pois todos os dias, alguma mulher irada sai
de casa, revoltada com o consorte, e diz assim: “Hoje eu vou dar para o
primeiro que encontrar”. Se bem colocado, este primeiro serás tu, bravo boêmio.
XI) Não temas a condição de macho-tupperware , aquele
sujeito que a freguesa do mesmo bar leva para casa com a esperança de devorá-lo
mais tarde –depois que o miserável estiver minimamente em condições técnicas
para o abate.
Sem drama, é isso mesmo. Nas tábuas sagradas da boemia, os
dez mandamentos já começam com 11 regras, no mínimo. Ajude você também a
construir o nosso grande código. Deixe sua colaboração aí nos comentários.
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